Entrevista Randy Cook
Introdução
Randy Cook é uma mistura de missionário, evangelista, erudito e professor. Apaixonado pelo assunto da salvação dos judeus, há 11 anos terminou indo morar em Israel, com a esposa Phyllis. Tem três filhos adultos e casados.
Leitor compulsivo, conhece de maneira profunda a história dos judeus - desde os tempos de Abraão, conforme registrado na Bíblia, até os dias de hoje.
Nesta entrevista o professor Randy fala do seu ministério, de Israel, de anti-americanismo e, obviamente, dos judeus.
Ele foi o palestrante principal da I Conferência Falando ao Coração, realizada em Fortaleza em abril de 2004, sob o tema Israel - Ontem, Hoje e Amanhã.
Entrevista
Mauro Clark - Quando e como começou o seu especial interesse pela salvação dos judeus?
Randy Cook - Desde o início da década de 70, quando estudava em uma faculdade teológica, tenho me interessado no Antigo Testamento - teologia, línguas, história, arqueologia, etc...
Isso posteriormente me levou a fazer duas viagens iniciais a Israel como turista. Durante minha segunda visita em 1984, permaneci por mais dez dias após a partida do meu grupo a fim de visitar alguns locais por conta própria. Foi nessa época, enquanto lia a Bíblia numa manhã em Jerusalém, que Deus usou o profeta Isaías para me desafiar ao evangelismo de judeus. Enquanto lia Isaías 62.1, as palavras alojavam-se em meu coração:
"Por amor de Sião, me não calarei
e, por amor de Jerusalém, não me aquietarei,
até que saia a sua justiça como um resplendor,
e a sua salvação, como uma tocha acesa."
É especialmente interessante que a palavra hebraica para "salvação" (yeshuah) é também a raiz do nome de Jesus (Yeshua). Era a isso, obviamente, que se referia o anjo quando disse a José "Ela dará à luz um filho e lhe porás o nome de Jesus, porque ele salvará o seu povo dos pecados deles." (Mt 1.21).
Isto ainda é verdade hoje em dia - a salvação não pode ser encontrada em nenhuma outra fonte que não seja o Senhor Jesus - e isso é verdade para qualquer judeu ou gentio (Atos 4.12).
MC - O que o levou a querer morar em Israel?
RC - Na época éramos missionários no Brasil, servindo em Natal (RN) pela Association of Baptists for World Evangelism (Associação Batista para o Evangelismo Mundial). Descobri que havia apenas quatro judeus morando lá. Não havia nem mesmo os dez necessários para se ter um minyan para orações na sinagoga.
Além disso, o líder da pequena comunidade judaica era um ex-pastor evangélico que se convertera ao judaísmo.
Entretanto, duas semanas mais tarde, minha mulher conheceu uma jovem judia na mercearia. E ela não era apenas uma judia, mas uma judia de Israel! Seu esposo estava trabalhando em uma plataforma marítima da Petrobrás. Assim, começou uma longa amizade que resultou em uma série de estudos bíblicos e lições de hebraico.
Isso também me levou a buscar um modo de aprender hebraico bíblico para que eu pudesse procurar respostas nas Escrituras. Eu não seria capaz de convencer um judeu com argumentos messiânicos se eu não os conseguisse provar através das Escrituras hebraicas.
É claro que, no final das contas, nenhum argumento meu seria suficiente - a persuasão deve vir do Espírito de Deus. Mesmo assim, argumentos que se utilizam da língua original conquistam a atenção de modo mais rápido.
À procura de um lugar para aprender hebraico, descobri o Institute of Holy Land Studies (Instituto de Estudos da Terra Santa), localizado em Jerusalém.
Resumindo, a diretoria de nossa missão aceitou a proposta de nossa ida para Israel com vistos para estudarmos hebraico enquanto planejávamos implantar uma nova igreja entre os judeus crentes.
Resumindo outra vez, fizemos isso entre 1986 e 1989, mas não conseguimos renovar nossos vistos. Sendo assim, conforme previamente combinado, retornamos ao Brasil.
Trabalhamos em um ministério chamado Beit Sar Shalom e em um seminário em São Paulo durante os quatro anos seguintes. Naquela época, fui convidado para voltar a Israel com o Master's College (localizado em Santa Clarita, Califórnia) para cooperar em um programa conhecido como Israel-Bible Extension Program (IBEX) (Programa de Extensão Israel-Bíblia). Temos vivido em Israel desde 1995.
A propósito, a congregação original em Jerusalém ainda está bem firme hoje em dia, com um pastor israelense e uma média de 200 pessoas freqüentando. No momento estamos no processo de iniciarmos uma nova igreja.
MC - Por que você acha que os judeus, depois de tanto sofrerem ao longo de dois mil anos, ainda são antipatizados pelo mundo?
RC - Creio que isto é fundamentalmente um problema de pecado relacionado à rebelião do homem contra Deus. Uma vez que Deus escolheu os judeus como o povo através do qual Se revelou, tanto na Bíblia como através do Messias, eles são uma representação de Deus para a humanidade.
Isso é verdade apesar da pecaminosidade deles tanto como indivíduos quanto como nação. É verdade porque depende da soberania de Deus, não da fidelidade da nação de Israel. Entretanto, tal fato tem freqüentemente levado a humanidade a certa animosidade contra os judeus porque eles representam as justas exigências de Deus para o homem pecador.
Tal escolha por Israel traz grande responsabilidade, não privilégio especial. Há uma célebre cena do filme "O Violinista no Telhado" na qual Tevya pede a Deus: "Não se importaria em escolher outra pessoa por enquanto?"
MC - É possível falar abertamente o Evangelho em Israel, nos dias de hoje?
Jamais tivemos restrições nessa área. É claro que há uma maneira boa e uma ruim de começar. Comumente há certa resistência ao Evangelho entre o povo judeu, especialmente entre os judeus religiosos, devido em grande parte à perseguição que sofreram através dos séculos nas mãos de muitos que se intitulavam cristãos. Como é verdade para todo grupo de pessoas, deve-se ganhar o direito de ser ouvido. Sempre haverá alguém que rejeitará não importa o que você disser. Entretanto, tenho de fato achado bem fácil entrar em assuntos espirituais com o povo judeu.
Somos chamados de "sal da terra" e uma das características do sal é causar sede. Tenho achado que lançar uma idéia que incite um questionamento sobre coisas espirituais é muito eficiente para o evangelismo com os judeus. Por exemplo: "Você não iria acreditar no que Novo Testamento tem a dizer sobre isso" ou "Jesus usou um argumento rabínico brilhante para esse assunto." A resposta quase imediata é "Nu*, então me diga." Uma vez que eles perguntam, é jogo limpo responder! (* Uma expressão de impaciência ou solicitação de ação.)
Há alguns anos, os crentes em Israel contrataram um bom advogado para dar uma opinião legal a respeito de leis que poderiam ter alguma aplicação para eles. Houve três que talvez pudessem afetar a propagação do Evangelho.
(1) Uma lei municipal de Jerusalém que proibia panfletos (que poderia então ser aplicada para folhetos ou outro tipo de literatura) foi originalmente dirigida a campanhas eleitorais, que resultavam em muito lixo de papel nas ruas. Essa lei foi posteriormente desafiada por dois professores da Hebrew University (Universidade Hebraica) e derrubada pelo argumento: "A liberdade de expressão é mais importante do que se ver livre do lixo."
(2) Uma lei federal proibindo o pagamento ou oferta de qualquer incentivo material que pudesse levar alguém a mudar de opinião (no caso, durante as eleições) jamais foi examinada em tribunal. Isto poderia trazer problemas, mas seria muito difícil definir "qualquer incentivo material".
(3) Uma terceira lei poderia ser mais difícil. É ilegal tentar persuadir um menor a mudar sua religião. Essa lei foi escrita para evitar uma conversão forçada de uma criança por um dos pais em um casamento misto. Da mesma forma, jamais foi examinada em tribunal nem aplicada ao evangelismo de crianças.
MC - A atitude do judeu típico de hoje com relação a Cristo é de hostilidade ou indiferença?
RC - É difícil dar uma resposta simples para essa questão. O que é um "judeu típico"? Se for um judeu ortodoxo, sim, é comum deparar-se tanto com hostilidade quanto com indiferença. Mas judeus ortodoxos em Israel somam menos do que 20% da população total.
Se for um judeu religioso, muitos teriam uma reposta semelhante, mas muitos outros estão abertos a ouvir sobre Jesus. Se para eles você representa uma inofensiva fonte de informações confiáveis, eles freqüentemente fazem várias perguntas sobre Jesus e o Novo Testamento. Você se deparará com uma enxurrada de boas perguntas.
Se for um judeu completamente secular (mais ou menos 40% da população de Israel), não há muita diferença entre compartilhar o Evangelho com eles e com qualquer gentio em qualquer lugar do mundo. A indiferença com relação a assuntos espirituais talvez seja a reação mais difícil e comum em qualquer lugar.
MC - Você acha que o judeu é mais fechado ao Evangelho do que o descrente comum?
RC - Louis Goldberg, ex-professor de Evangelismo Judaico no Moody Bible Institute (Instituto Bíblico Moody) escreveu um livro intitulado Our Jewish Friends (Nossos Amigos Judeus), no qual ele mostra que, per capita, mais judeus chegam à fé do que gentios!
Há mais ou menos dezesseis milhões de judeus vivos hoje (a contagem de certa forma depende de como você define "quem é judeu?") entre os oito bilhões de habitantes da Terra. Uma porcentagem maior deles está se convertendo em relação aos gentios.
Outro modo de ver essa questão aqui em Israel é o fato de que hoje há quase noventa congregações de yehudim meshihi'iim (judeus messiânicos). Esse número é aproximadamente o triplo das estatísticas há vinte anos. O número total de judeus crentes em Israel está por volta de quatro ou cinco mil. Há apenas quinze anos eram apenas dois mil. Não se trata apenas de um grande número de conversões. Muitos mais dentre os que eram "crentes secretos" estão agora dispostos a tornarem pública a sua fé, desta vez sem o medo de se identificarem como crentes.
MC - Você vê alguma relação entre a posição de superpotência dos Estados Unidos e o modo amigável como esse país tem tratado os judeus? Seria uma espécie de retribuição divina?
RC - Gênesis 12.1-3 contém as palavras de Deus dirigidas a Abraão, o que chamamos hoje de "Aliança Abraâmica". Elas foram pronunciadas quase quatro mil anos atrás e não há nada em qualquer outro lugar nas Escrituras que as revoga ou indica de qualquer forma que não têm mais aplicação para nós nos dias de hoje.
No final das contas, não importa o que eu penso sobre o assunto. O que a Bíblia diz?
"...de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção! Abençoarei os que te abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; em ti serão benditas todas as famílias da terra." (Gn 12.2-3)
O apóstolo Paulo diz que esta última frase é, na verdade, o evangelho prenunciado (Gl 3.8). Isso atribui aos elementos de bênção e maldição de tal aliança a mesma certeza de nossa própria salvação.
MC - Você vê alguma relação entre o anti americanismo tão em moda atualmente e o modo amigável como os Estados Unidos tem tratado Israel?
RC - Claro.
MC - Você e sua família podem viver abertamente como crentes em Israel, ou é preciso tomar certas precauções?
Vivemos e nos locomovemos de modo totalmente livre - tanto como cristãos quanto como simples residentes estrangeiros. Como cristão, nunca sofri nenhum ataque ou ameaça contra minha pessoa. Como americano, normalmente sou alvo de olhares e comentários muito mais em qualquer país estrangeiro que visito do que aqui em Israel. Eu quase nunca me sinto visivelmente notado ou em perigo de qualquer espécie. Mesmo em matéria de assaltos ou outros crimes comuns, raramente corremos risco.
MC - A reconstrução do Templo é algo comentado em Israel? Por quem e de que maneira?
RC - Os judeus ortodoxos dão muita atenção a esse assunto, mas provavelmente não constituem mais do que 10% da população total. Mesmo entre eles, a atitude geral é a de que isso é o trabalho do Messias e não algo que devemos buscar realizar com nossa própria força. Quando muito, a maioria diria que deveríamos nos preparar espiritualmente.
Há um grupo conhecido como The Temple Mount Faithful (Os Fiéis do Monte do Templo), que procura manter o assunto exposto ao público, mas eles são vistos como uma pequena minoria que tem pouca ou nenhuma influência sobre o grande público. Suponho que 70-80% da população jamais pensa sobre esse assunto a não ser com um tom de: "Esqueça! Já temos problemas suficientes. Por que causar esse alvoroço também?"
Por outro lado, The Temple Institute (O Instituto do Templo) é uma organização em Jerusalém que realiza pesquisa séria em fontes judaicas literárias e históricas para determinar as qualificações adequadas de cada detalhe relacionado com o Templo - vestimentas dos sacerdotes, utensílios, práticas rituais, o próprio edifício, etc... É uma boa fonte de informação sobre qualquer coisa relacionada com o Templo.
MC - Você acha que as igrejas evangélicas brasileiras deveriam dar mais atenção ao evangelismo de judeus? Haveria uma maneira prática de fazer isso?
RC - A Igreja em qualquer parte do mundo poderia melhorar nesse sentido. Na verdade, poderíamos e deveríamos fazer mais em todos os aspectos do evangelismo do que estamos fazendo atualmente.
Paulo disse que o Evangelho é "primeiro do judeu" (Rm 1.16). Ao mesmo tempo em que isso tem uma implicação histórica (no livro de Atos, eles foram os primeiros a ouvir e crer), há também, certamente, uma aplicação teológica.
O próprio Paulo, o apóstolo dos gentios, nunca falhou em ir primeiro na sinagoga e testemunhar para os judeus quando entrava em um novo campo missionário. Somente depois de rejeitarem a sua mensagem, ele se dirigia para os outros. Muitos de seus companheiros e colegas de trabalho eram homens e mulheres judeus que continuaram a compartilhar o Evangelho em seus círculos culturais.
As igrejas brasileiras poderiam começar onde estão.
Primeiro, convidem palestrantes com conhecimento sobre evangelismo de judeus para dar um treinamento sobre esse assunto para sua igreja.
Segundo, procure judeus em sua cidade ou área e faça amizade com eles. Convide-os para programações especiais que possam ser do interesse deles. Por exemplo, qualquer feriado judeu que você possa identificar e estudar como igreja buscando aplicações para a nossa fé neo-testamentária seria de interesse para um visitante judeu.
Terceiro, há um grande número de judeus na maioria das grandes cidades brasileiras e há vários ministérios cristãos procurando alcançá-los. Descubra sobre tais ministérios e apóie aqueles com os quais você concorda teologicamente. Quarto, há várias organizações internacionais que estão procurando alcançar judeus em Israel e em qualquer lugar. Adquira sua literatura de modo que você possa orar e apoiar financeiramente seus esforços.
Finalmente, ore para que o Senhor lhe conduza e a outros em sua congregação ao envolvimento pessoal com o evangelismo de judeus. Você ficará maravilhado ao ver como Ele pode e realmente abre portas - mesmo quando você não imagina haver tal possibilidade ao seu redor.
MC - Uma pergunta inevitável: mesmo sabendo que o importante é ter falado de Cristo, você já presenciou a conversão de algum judeu?
RC - Sim. Enquanto estava ainda no Brasil, consegui falar pessoalmente com três judeus (um em Recife e dois em São Paulo). Eles oraram e pediram a Deus que perdoasse seus pecados e os desse vida eterna.
Até o momento, sei de apenas um aqui em Israel que tomou uma decisão semelhante. Como se diz, é nossa responsabilidade plantar fielmente a semente e Deus proverá a colheita em Seu próprio tempo e de Seu próprio modo.
Posso dizer que há vários indivíduos aqui em Israel que são evangelistas excelentes e bem sucedidos. Aqueles que, do ponto de vista humano, parecem estar fazendo o melhor trabalho são crentes israelenses que chegaram à fé por meio de circunstâncias difíceis e estão empolgadíssimos por Deus com uma mensagem pessoal para compartilhar.
MC - Um judeu que se converte a Cristo hoje, em Israel, ainda é muito perseguido pelos parentes?
RC - Ainda há casos assim. Por exemplo, aqui no kibbutz onde moramos, todos os membros são judeus. Há mais ou menos um ano, um jovem judeu que tinha acabado de colocar sua fé em Jesus como o Messias veio a nós em busca de ajuda e um lugar para ficar. Sua família ortodoxa o expulsou e recusou-se até a falar com ele. Seu pai fez seu funeral e o considerou como morto. Ele conseguiu achar um emprego aqui no kibbutz e um lugar para morar até que conseguiu colocar os pés no chão de novo. Hoje ele divide um apartamento em Jerusalém com outros crentes e freqüenta a Hebrew University.
Uma das alegrias de estarmos localizados onde estamos é que este kibbutz tem se tornado um dos centros espirituais do movimento messiânico em Israel. Várias vezes ao ano temos acampamentos e conferências para vários grupos de judeus crentes. Por exemplo, semana passada, mais de setenta soldados israelenses crentes em Jesus tiveram uma conferência durante três dias.
Todos os anos há uma conferência sobre música onde crentes messiânicos se reúnem para produzir boa música para nossas congregações. Várias congregações têm retiros usando nosso centro de conferências e as instalações do hotel.
Há seis semanas de acampamentos de verão para jovens que se reúnem aqui todos os anos. Além disso, toda sexta-feira o kibbutz (que tem uma grade instalação para turistas locais e internacionais) oferece um desjejum para o qual centenas de israelenses não salvos vêm todas as semanas.
O Evangelho é compartilhado com eles de várias formas através de música, literatura e testemunhos pessoais.
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